quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Sobre como jogar Castelo Falkenstein

Há algum tempo, conversando com um provável futuro companheiro de RPG*, debatemos a mecânica de jogo de Castelo Falkenstein. Na visão dele, a forma como as regras foram definidas é inconsistente e não atende ao propósito. Eu, do contrário, considero uma brincadeira interessante.

Não vou me alongar na explicação das regras do jogo, pois eu mesmo não lembro em profundidade como são. Não é um livro tão difícil de encontrar e tem uma base sólida de fãs. Basta uma busca mais cuidadosa para encontrá-las em detalhes. Os comentaristas desse tópico também podem complementá-lo para melhorar sua leitura.

Basicamente, os jogadores têm um número de quatro cartas de baralho em mãos (acredito que são 5, mas realmente não me recordo). Cada naipe significa um tipo de ação e cada carta um valor. Ao participar de uma ação cujo o mestre exija um teste, o jogador escolhe quais cartas quer baixar. As cartas do naipe pertinente ao tipo de conflito têm seus valores somados integralmente, ao passo que os naipes não relativos somam apenas um ponto independente de seu valor. No fim da jogada, o jogador compra cartas até que volte a ter a mão cheia.

Em tese, você pode escolher descer todas as cartas de uma vez, somá-las integralmente e comprar todo um novo conjunto de cartas para a próxima rodada. A diferença entre isso e um rolar de dados é que você sabe por antecipação qual o seu resultado para cada tipo de ação possível nas regras. Isso pode criar uma distorção no jogo, pois o jogador começará a guiar suas ações na direção do que ele sabe que tem a melhor chance de ter sucesso.

Não há dúvidas de que seja possível jogar dessa forma, mas essa não me parece nem de longe a melhor forma de jogar. Não estou levando em conta representação ou o interesse do jogador em contar uma boa história. Considero isso um pressuposto e não um diferencial. Porém, mesmo em termos de estratégia, a melhor forma de usar as cartas ainda é uma escolha criteriosa da carta jogada.

A história é imprevisível e as situações que seu nobre personagem será posto a prova não estão sob o seu controle. Nesse ponto, Castle Falkenstein se torna um jogo que além de sorte e atributos, existe a necessidade de uma boa administração de recursos. Saber se o situação pede aquele As de copas que está secando na sua mão ou não, é um elemento sofisticado das regras, que exige uma postura diferenciada do jogador.

Longe dessa regra ter apenas um caráter mecânico, ela está alinhada com a pretensão literária do jogo por estimular o clímax da aventura. Um jogo que conte mais com a sorte do que com a administração de recursos pode ser extremamente frustrante. Imagine que depois de um dia inteiro de jogo, finalmente seu guerreiro está com a espada em punho, pulando sobre o Dragão Vermelho que está a ponto de devorar o exaurido mago do time. Seu personagem tem ótimos atributos, está corretamente equipado e com todas as magias possíveis que melhoram sua eficiência. Então você rola o dado e tira 1. Não há discussão: 1 é sempre uma falha. No Castelo Falkenstein, caso o jogador opte por descer todas as suas cartas a cada desafio, ele não estará aproveitando bem essa segurança climática que o jogo propõe, o personagem se torna inconstante e, caso a inconstância não seja sua marca, inconsistente.

Se durante uma seção inteira de jogo você não conseguir construir uma boa mão que garanta ações incríveis você vai evitá-las, buscando contornar os desafios principais de outra forma e buscando participar de desafios menores que possam melhorar sua mão. Se extrapolarmos esse modelo percebemos que, quando compreendido, ele se torna uma mecânica excelente para simular o comportamento mais protagonista e ousado ou mais conservador e coadjuvante. Melhor ainda é a certeza de que, ao longo de várias seções, todos terão seus dias de protagonista determinante, criando um equilíbrio narrativo natural.

* Esse tópico também é bom: companheiros de jogo são como um relacionamento. Você primeiro toma um os dois chopps e conversa com a pessoa sobre RPG. Assim você descobre qual a visão que ela tem do jogo, qual as expectativas dela em relação as aventuras, sistemas e humores. Com isso você decide se liga no dia seguinte, se vai procurar a pessoa novamente, se é um desejo tórrido, um relacionamento estável ou se você vai atravessar para o outro lado da rua quando ver essa pessoa de longe. No caso do Igor, esse futuro provável companheiro de jogo em questão, mal posso esperar pelas mesas de Spirit of the Century ou Trail of Cthulhu.