quinta-feira, 10 de julho de 2008

Amplitude de parâmetros e aleatoriedade: questão de design

Recentemente adquiri e comecei a me preparar para jogar Mutantes e Malfeitores. A tradução da Jambô ficou honesta e elegante, pena que o texto original seja por vezes confuso. Muitos exemplos acabam por confundir mais do que explicar. Na medida em que se entendem as regras do jogo imaginamos outras formas melhores de explicá-las, faltou um pouco de didática na redação.

Debatendo com um amigo que é fã de regras, chegamos a alguns pontos interessantes sobre o design das regras D20 e essa adaptação com clima de quadrinhos. Um dos pontos levantados dizia respeito à elegância das regras. Segundo ele, o sistema tinha todas as ferramentas para resolver um ataque com apenas uma rolagem de dados por parte do atacante. Sendo a dificuldade a resistência do oponente, bastaria somar a margem de sucesso ao dano básico e diminuir da defesa passiva para se ter o dano final do ataque. Porém, argumentei que essa seria uma forma muito frustrante de jogar. O jogador cujo personagem sofresse um ataque não participaria ativamente da situação, dificultando a imersão no jogo. Considero que essa redundância de rolamentos gera maior interação e emoção e este é o foco da brincadeira.

Uma outra questão debatida foi sobre a curva de variação dos dados se comparada com a amplitude dos atributos, perícias e parâmetros de disputa. Uma coisa que acho estranha em Mutantes e Malfeitores é a baixa variação dos parâmetros. Se for uma aventura de Nível de Poder 10, os personagens possivelmente vão atacar tendo 10 como parâmetro e se defender também com 10, pois é esse o limite de poder combinado. Mesmo podendo negociar com o seu mestre uma troca entre o limite do ataque e o limite da defesa, essas sempre serão exceções. Em casos como esse, a alta variação que um dado de 20 lados oferece é essencial para oferecer alguma surpresa ao jogo.

Já em outros jogos da linha D20 como o próprio D&D, a variação entre os parâmetros é naturalmente maior, pois estas são definidas não pelo nível da aventura, mas sim pelos níveis de poder particulares de cada classe. Nesse caso, é interessante pensar que substituir o d20 por 2d10 somados pode trazer uma nova experiência de jogo. Rolamentos de 2d10 têm uma curva diferente (em sino) do d20 (linear), pois existe uma concentração maior de resultados na média. Dessa forma, o jogo pode ficar menos frustrante, pois se você preparou um personagem para ser bom em alguma tarefa ele tem mais chance de ser bem sucedido nela.

Donde conclui-se que para manter um jogo divertido precisamos orquestrar esses dois fatores. Se os personagens variam muito entre si em termos de parâmetros e com isso podem ser altamente especializados em suas capacidades, é interessante escolher rolamentos que se concentrem na média, pois se minimiza a chance de um personagem especialmente bom em algo ser vítima de sucessivos fracassos. Se os personagens variam pouco entre si em termos matemáticos, operando em curta amplitude de valores, é necessária uma aleatoriedade maior para jogo se tornar mais dinâmico. Desta forma a resolução das ações fica antes a cargo da sorte e do uso criativo dos recursos e não da estratégia de construção de personagens.

Do contrário, a baixa variação de parâmetros e baixa aleatoriedade tornariam o jogo por demais linear e sem emoção. Ideal para máquinas, muito pouco atraente para humanos. Alta variação de parâmetros e alta aleatoriedade nos dão o D20 system.

Nenhum comentário: